P. Ildefonso Xavier (1953-2024)

Aprendi a dar estalidos com os dedos porque, quando era responsável pela música litúrgica no Seminário Conciliar de Braga e orientava os alunos no corpo da capela, tinha no coro alto da mesma um organista que frequentemente adormecia durante as celebrações da liturgia… Então eu dava um estalido com os dedos… ele acordava sobressaltado e corria para o Órgão para tocar, normalmente o canto do Ofertório… Esse organista chamava-se Ildefonso Xavier, que eu sempre tratei por “Ainaro”, o nome da sua terra de origem, um rapaz simpático, um pouco excêntrico integrando um grupo de seminaristas timorenses, alunos de Filosofia ou de Teologia que, por volta de 1975 vieram para Portugal e foram distribuídos por alguns Seminários. Dos três que frequentavam o mesmo ano todos se ordenaram: o Ildefonso Xavier, o Domingos Alves e o Domingos Soares. Acabo de ter a notícia do falecimento do P. Ildefonso Xavier, o que não me surpreendeu totalmente pois sabia da sua débil saúde e dos problemas que teve nos últimos tempos em que cá esteve antes de regressar definitivamente a Timor.

O P. Ildefonso Xavier foi então meu colega de Seminário durante os anos 1974-1978; era dois anos mais velho que eu, e era um dos organistas no Seminário, juntamente com o José Zeferino Esteves, também já falecido, quando eu era o responsável pela música no Seminário Conciliar, durante cinco anos. Ele tocava ainda na paróquia de São João do Souto, na cidade de Braga, acompanhando um Coro dirigido pelo P. Adão Lima, para o qual eu escrevi então (1976) as Vésperas do Santíssimo Sacramento. Concluídos os estudos de Teologia fez estágio na paróquia de Maximinos, Braga, no ano de 1978-79, onde eu era Director do Coro Paroquial e me ajudou como cantor e organista algumas vezes já que o Coro tinha organista próprio.

Tendo sido ordenado em 1979, como tinha um grande amigo seminarista, natural da Gave, Melgaço, foi trabalhar para esse arciprestado, onde foi Pároco em várias paróquias durante vinte e oito anos, tendo aí desenvolvido um notável trabalho ao nível da pastoral vocacional e sobretudo na área da música e da liturgia, na formação de cantores e de organistas paroquiais, e ainda como professor de Educação Musical, Foi colaborador do Secretariado Diocesano de Pastoral Litúrgica, particularmente durante a minha estadia em Roma. O P. Ildefonso tinha uma personalidade simples, cordial, um tanto ingénua talvez e, apesar de ter sido envolvido em polémicas e confrontos inexplicáveis que me visaram particularmente, e que me abstenho de comentar, mantivemos sempre a mesma amizade, eu apreciava o seu trabalho e sei que ele apreciava e admirava o meu. Tive oportunidade de, aqui há uns sete anos talvez, lhe dar uma pen com praticamente toda a música que eu tinha escrito até então para que ele conhecesse melhor o que eu estava a fazer. Desde esse dia nunca mais o vi. Soube que partira para Timor pouco depois. O trabalho feito em Melgaço por ele foi muito bom e um dos exemplos é o Coro de Parada do Monte ainda hoje cheio de vida.

Lamentando profundamente o seu desaparecimento só lhe posso deixar aqui um voto: “Naro, descansa em paz e que o director do coro dos anjinhos nunca te perturbe esse descanso com um estalido de dedos…