Uma palavra a abrir…
Porquê um “site”? Era há muito esperado por uns, era desejado por outros, foi esboçado e preparado por dois amigos cuja generosidade não saberei agradecer, finalmente assumido… contando com os eventuais riscos de uma exposição, abrimos aqui as portas de um espaço que coloca à disposição dos interessados quase uma vida de trabalho, realizado no silêncio e no espaço restrito de um apartamento, embora inspirado ou despertado, quantas vezes, na paisagem que desfrutava ao compasso das caminhadas que os cuidados de saúde já me vão impondo.
Durante muito tempo, fui escrevendo ou por solicitação de algum interessado ou por estrita necessidade de encontrar recursos para cumprir as funções de responsável pela actividade musical em diversos campos, quer no mundo sacro ou litúrgico quer no mundo profano. Nesses tempos orientava-me a ideia de que não valia a pena escrever pensando no futuro; já temos muita música boa, graças a Deus, e não ia ser eu acrescentar valor a um património cujos méritos são incontestáveis.
Depois comecei a escrever com um pensamento: pode não despertar grande interesse nos dias de hoje, mas um dia talvez alguém se perguntará por onde andou ou onde esteve metido quem escreveu estas coisas. Era, em grande parte, uma escrita realizada nos tempos livres, nos intervalos de outras ocupações decorrentes de compromissos académicos, pastorais, e quantas vezes a léguas do mundo da música.
Nos tempos mais recentes, pude finalmente concentrar-me um pouco mais na actividade da escrita musical, com uma regularidade que não me era consentida antes e, paradoxalmente, quando as forças físicas já não acompanham a vontade de escrever ao ritmo das ideias que pululam desordenadas por uma cabeça já marcada por algum cansaço. Mais ainda, foram os dramáticos tempos da pandemia que, com o confinamento obrigatório, me obrigaram a reagir ao isolamento, desempoeirando páginas manuscritas relegadas para o sótão das memórias, ou libertando um pouco a fantasia, despreocupadamente, sem pretensões…
Apenas um círculo muito restrito de amigos é conhecedor da quase totalidade do que fui produzindo, mas o estímulo que ia recebendo daqui e dali, não só me levava a continuar, mas também me provocava no sentido de abordar novas iniciativas. A memória e o respeito pelos que antes se dedicaram a este tipo de trabalho levou-me a “revisitá-los”, trazendo-os ao presente, num tempo que facilmente esquece porque exageradamente centrado no imediato; eles têm ainda muito para dar, para mostrar, para ensinar… e a sua obra esconde virtualidades que eu apenas me diverti a colocar à disposição de quem pretenda desfrutar de boa música, da mais simples à mais complexa, mas sempre boa.
A partir de sumárias indicações minhas, este espaço é obra dos dois irmãos Ribeiro, o André Gentil, na parte técnica da informática, e o Nuno para o “design”; a mim coube organizar e inserir neste espaço o material elaborado ao longo de mais de meio século de actividade. À produção própria, associei depois um conjunto de recursos que podem ser úteis do ponto de vista informativo e didáctico; afinal, o que fizemos não nasceu do nada, tem uma história, assenta em bases sólidas, oferece lições que vamos sorvendo gota a gota…
Parafraseando o grande Johann Sebastian Bach, na introdução ao Orgelbüchlein, espero agora que este espaço sirva também para “glória de Deus e para ilustração dos que quiserem, por meio da arte dos sons, contribuir para essa mesma glória”.
Jorge Alves Barbosa